Sobre a alteração do Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial - RJIGT

Carta ao senhor Presidente da República – em defesa do solo rústico

Nuno Gomes Oliveira, Presidente da direção da FAPAS, FAPAS- Associação Portuguesa para a Conservação da Biodiversidade

O normal, nesta época do ano, é ser o Presidente da República a dirigir uma mensagem de esperança aos portugueses.

Mas permita-me que, desta vez, seja eu a dirigir uma mensagem ao Senhor Presidente, preocupado que estou pela involução da política ambiental no nosso país e com a promoção da especulação imobiliária, com grave prejuízo para o território; a minha mensagem para 2025 não é, pois, de esperança!

Cometeu V. Exª. duas falhas, a meu ver indesculpáveis, no que toca ao ambiente e conservação do património natural de Portugal, uma por culpa do anterior governo, outra por culpa do atual.

Quando em 6 de agosto de 2019 promulgou o Decreto-Lei n.º 116/2019, que criou a cogestão das áreas protegidas, deu um grande contributo para a degradação e destruição das áreas protegidas nacionais, desde o nosso único Parque Nacional até à mais pequena reserva natural; o resultado está bem à vista!

Agora, em 26 de dezembro, ao promulgar o Decreto-Lei n.º 117/2024, que altera o Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial e vem permitir construir prédios em solos rústicos, deu V. Exª. um enorme pontapé no território e até reconheceu que esta lei é um "entorse significativo em matéria de regime genérico de ordenamento e planeamento do território".

De resto já muitos especialistas escalpelizaram o assunto nas páginas dos jornais, e ficou claro que, como escreve hoje no Público a Presidente do conselho diretivo da Ordem dos Arquitectos — Secção Regional do Norte, Arq. Conceição Melo, que “A alteração à lei dos solos preconizada pelo Governo, e promulgada na semana passada pelo Presidente da República, vem escancarar as portas à especulação imobiliária.”

Para além de ignorar isso – que é óbvio - o Senhor Presidente da República esqueceu-se do esforço do povo português que durante séculos arroteou terrenos de um país montanhoso e rochoso, para os converter em terra cultivável, aumentando, assim, a área agrícola de Portugal e a possibilidade de alimentar a nossa população, e promulgou o inverso, transformar solos agrícolas em blocos de cimento.

E também esqueceu que o solo rústico, seja agrícola ou florestal, continua a ser um dos maiores patrimónios de uma nação, mais valioso que o ouro do Banco de Portugal, fundamental para a alimentação, o ciclo da água, a conservação da biodiversidade e a luta contra as alterações climáticas.

Feliz 2025, Senhor Presidente, sem destruição do solo rústico!

31/12/2024

Nuno Gomes Oliveira
Biólogo, Presidente da Direção da FAPAS - Associação Portuguesa para a Conservação da Biodiversidade

(Mensagem enviada em 31/12/2024 às 13h22 para a Presidência da República)