Sobre a alteração do Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial - RJIGT

Parecer AD URBEM

A alteração em apreço ao Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial, tal como já acontecia, aliás, com a alteração anterior:

  • Tem consequências negativas em matéria de ordenamento do território;
  • Procura responder ao grave problema de acesso à habitação, sendo duvidoso que contribua relevantemente para o objetivo pretendido;
  • Procura instituir processos simplificados, mas origina, de facto, dúvidas e complexidades processuais.

O anexo ao Parecer, com as propostas de alteração ao diploma, está disponível em baixo.

É sabido que os Planos Diretores Municipais que têm estado em vigor (muitos ainda estão) tinham perímetros urbanos sobredimensionados, muito acima das reais necessidades de urbanização e edificação, o que permitiu e até fomentou uma ocupação urbana fragmentada, desordenada. Tem existido, portanto, uma quantidade excessiva de solo urbano. Não obstante, esses terrenos mantêm-se por urbanizar.

Para resolver a carência, o caminho não deveria ser o de aumentar ainda mais o solo urbano e a consequente fragmentação. O que há a fazer, é mobilizar o solo urbano existente, sendo que os municípios dispõem de instrumentos para tal, nomeadamente o recurso a “unidades de execução”, que pouco tem sido utilizado.

 

Não existe em Portugal um problema quantitativo de habitação, o rácio “n.º fogo/ n.º de famílias” é o maior da Europa. Existe, sim, um grave problema de acesso, motivado pelo grande número de fogos devolutos e pela desadequação entre preços da habitação e rendimento das famílias.

Aumentar a construção de fogos a preço atual de mercado (como seriam os “de preço moderado”) pouco ajudará. E, sobretudo, a classificação de novo solo urbano irá aumentar imenso o respetivo valor, o qual irá incidir no custo e no preço da habitação, nada alterando de essencial.

 

Estas alterações legislativas têm multiplicado os procedimentos de reclassificação do solo rústico em urbano: os gerais, de revisão ou alteração de PMOT; os realizados através de “planos de pormenor com efeitos registais”; o “regime simplificado” estabelecido no Artigo 72.ºA; o “regime especial” estabelecido no Artigo 72.º B.

Estes diferentes caminhos originam, no quadro legal aplicável, incoerências, dúvidas, complexidades e falta de transparência. O quadro relativo ao ordenamento do território necessita de estabilidade, eventuais alterações deveriam visar uniformização e simplificação.

No caso da reclassificação do solo rústico em urbano, deveria traduzir-se em:

Clareza e rigor na identificação dos casos em que seria admitido:

- Situação de facto excecional, o que pressupõe inexistência de solo classificado como urbano ou desadequação do existente ao programa pretendido.

- Localização adequada, garantindo uma efetiva “consolidação” do tecido urbano.

- Garantias de efetiva execução, o que pressupõe prazos, identificação dos agentes executores e garantias de financiamento.

Simplificação, traduzida na adoção de um só procedimento, que poderia ser o da “unidade de execução”, já que este é um instrumento muito operativo, com simplicidade jurídico/administrativa e de facto executório.

 

O que se sugere corresponde a uma abordagem ao tema em apreço que se pensa a adequada e para a qual, quando oportuno, a AD URBEM se afirma disponível para colaborar.Sem prejuízo do afirmado, no presente contexto, de possível alteração ao Decreto-Lei n.º 117/2024, de 30 de dezembro, apresenta-se uma sugestão em Anexo visando o que consideramos que seria uma melhoria do diploma. Sublinham-se, aqui, os dois ajustes que, na linha da argumentação antes apresentada, se nos afiguram fundamentais:

I) Clarificação/ limitação das situações em que é admitida a reclassificação do solo de rústico para urbano.

Para tal, sugere-se:

Artigo 72.º [...]

1- A reclassificação para solo urbano tem caráter excecional, sendo limitada aos casos de inexistência de áreas urbanas disponíveis e comprovadamente necessárias para a finalidade em concreto e ao desenvolvimento económico e social, traduzindo uma opção de ocupação territorial devidamente fundamentada quanto à viabilidade económica e financeira e à sua sustentabilidade em termos ambientais, patrimoniais, económicos e sociais.

2 - A reclassificação para solo urbano deve contribuir, de forma inequívoca, para a consolidação das áreas urbanas, assegurando contiguidade e coerência com a malha urbana existente, e para o desenvolvimento sustentável do território.

3 - A reclassificação para solo urbano obriga a que, na deliberação e no ato de reclassificação sejam estabelecidas:

a) A identificação de todos os encargos urbanísticos decorrentes da operação, incluindo os decorrentes do seu impacto no sistema de infraestruturas existentes e a consequente necessidade de reforço e manutenção.

b) A fixação de quem irá suportar esses encargos, de prazos de execução, de garantias de financiamento e de efetiva execução, de consequências em caso de incumprimento e das condições de redistribuição dos respetivos benefícios.

Artigo 72.º-A [...]

[Revogar na íntegra]

Artigo 72.º-B [...]

1 - Os municípios podem determinar a reclassificação para solo urbano mediante o procedimento de alteração especial do plano diretor municipal definido no presente artigo, sempre que a finalidade seja habitacional ou conexa à finalidade habitacional ou usos complementares e desde que, cumulativamente:

a) sejam cumpridas as exigências constantes dos números 1 a 3 do artigo 72.º Seja assegurada a consolidação e a coerência da urbanização a desenvolver com a área urbana existente;

 

II) Abandono do conceito de “habitação a valor moderado”, adotando antes os de “custos controlados” e de “arrendamento acessível”.

Para tal, sugere-se:

Artigo 72.º-B [...]

1 - Os municípios [...] cumulativamente:

b) Pelo menos 700/1000 da área total de construção acima do solo se destine a habitação pública, a custos controlados ou para arrendamento acessível ou a habitação de valor moderado, nos termos do n.º 8;

9 - (e seguintes): eliminação

 

O Anexo “Sugestão de ajustes ao Decreto-Lei n.º 117/2024, de 30 de dezembro” está disponível em baixo.

Anexo ao Parecer AD URBEM sobre o Decreto-Lei 117/2024 de 30 de dezembro
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